pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO: maio 2014
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sábado, 31 de maio de 2014

#OcupeEstelita questiona projeto em área histórica de Recife

#OcupeEstelita questiona projeto em área histórica de Recife

Por Adriana Delorenzomaio 30, 2014 14:53

Em local com vista privilegiada, construtoras querem erguer 13 torres com 40 andares; e a população quer participação e propostas que integrem a cidade, além de questionar modelo urbano trazido pelos espigões gigantes
À margem do rio Capibaribe, no Centro de Recife, manifestantes tentam impedir a demolição de armazéns do Cais José Estelita. A ocupação reivindica que o conjunto de galpões seja transformado num projeto que “valorize o centro histórico e uma das mais belas vistas com verdadeira modernidade: integrando a área às ruas do bairro, à história e à vida da cidade”. De um lado está o que a população deseja e do outro, grandes construtoras que, ao que parece, contam com o apoio do prefeito Geraldo Júlio (PSB).
(Foto: Reprodução/Facebook)
Área com vista privilegiada e histórica traz à tona o debate sobre  a cidade (Foto: Reprodução/Facebook)
No último dia 21, o consórcio Novo Recife (formado pela Moura Dubeux, Queiroz Galvão, G.L. Empreendimentos e Ara Empreendimentos) iniciou a demolição dos galpões, onde planeja construir 13 torres de 40 andares. O impacto causado por um projeto desses é enorme e é objeto de cinco ações na Justiça Federal e Estadual. Os manifestantes exigem audiências públicas para discussão do plano urbanístico da área com a participação da sociedade civil.
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) embargou a demolição do cais no dia 22/5. O Ministério Público Federal também se pronunciou e condenou a ação “agressiva e irregular”, feita sem Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV).
Desde 2012, o grupo Direitos Urbanos – Recife tem atuado em defesa do cais, divulgando ações e denúncias.  Em 19 de dezembro de 2012, o Ministério Público ingressou com Ação Civil Pública solicitando, em caráter liminar, “a suspensão de todo e qualquer ato administrativo referente ao projeto e, no mérito, a declaração de sua nulidade desde o início”.
“O Ministério Público não avalia o conteúdo arquitetônico do Projeto (se é feio ou bonito, se é alto ou baixo, elitista ou democrático), mas a existência de vícios formais e ilegalidades na sua condução”, disse à época a promotora de Justiça do Meio Ambiente e do Patrimônio Histórico-Cultural do Recife, Belize Câmara Correia.
Entre as ilegalidades, está o fato de uma área de 100.000 m2 não ter sido previamente parcelada, ou seja, é preciso transformar essa grande área num trecho da cidade, com garantia de áreas públicas, vias de circulação, áreas verdes, equipamentos comunitários etc.
Além disso, a promotora explica que parte do empreendimento localiza-se em área de entorno de monumentos tombados pelo Iphan. “Pela lei, essas áreas de entorno possuem restrições, justamente para possibilitar a visada dos monumentos tombados, cujo deleite da paisagem pertence a todos os cidadãos.”
O movimento alerta que a venda do terreno foi feita de forma irregular, e que a prefeitura da cidade aprovou o projeto imobiliário sem uma audiência pública que consultasse a população e também sem um plano urbanístico, exigido por lei.
Nesta quinta-feira, manifestantes do movimento bloquearam o Viaduto Capitão Temudo, Zona Sul do Recife, eles pedem diálogo com o prefeito Geraldo Júlio (PSB), que até o momento não se pronunciou sobre o assunto.
O Ministério Público de Pernambuco (MPPE) encaminhou um ofício à Prefeitura do Recife, nesta quinta (29), para que o Executivo municipal realize audiência pública sobre o projeto Novo Recife, com a presença do prefeito.
O #OcupeEstelita já ganhou apoio de recifenses como a cantora Karina Burh, que fará um show na ocupação, no próximo domingo (1º), e do deputado Jean Wyllys (PSOL-PE).
Aqui o abaixo-assinado que será encaminhado ao prefeito.
(Publicado originalmente na Revista Fórum)
ocupe estelita

quinta-feira, 29 de maio de 2014

Abreu e Lima: Um motim dos consumidores excluídos?




Foto: Che ne pensi? Condividi

JOSÉ LUIZ GOMES ESCREVE 

                        



Ainda muitas inquietações pelas redes sociais sobre os episódios de saques e arrombamentos de lojas que ocorreram na cidade de Abreu e Lima, durante a greve da Polícia Militar. Um fato que alcançou repercussão internacional. Escrevemos muito sobre o assunto, pois temos algumas ligações afetivas com o município. Até recentemente, a cidade era apenas um distrito de Paulista, conhecida como Maricota, penso que em razão das muitas casas de sem-vergonhices existentes no local. Que Deus nos perdoe, Liêdo Maranhão – um estudioso profundo da cultura popular, falecido recentemente – caso tenhamos usado um termo inapropriado. Feliz ou infelizmente, a cidade já se livrou do pecado da carne. Hoje é um dos maiores redutos evangélicos do Brasil. Para ser mais preciso, segundo dizem, a maior densidade de população evangélica da América Latina.
                                      Pode ter se livrado da ira divina, mas permanece submetida ao julgo dos políticos sem espírito público. Naquele dia fatídico, logo cedinho, a população da cidade foi acordada com uma lavagem de roupas sujas entre suas lideranças políticas. Uma birra entre o ex-prefeito e o atual, onde não faltaram acusações de malversação de recursos públicos. No dia anterior, mais um atropelamento com morte num de seus distritos, a Matinha, fato que ocorre com certa frequência. Trata-se de um trecho bastante perigoso. O Município é cortado ao meio por uma rodovia federal. Há engarrafamentos quilométricos no local. Certamente algumas medidas precisam ser tomadas pela esfera pública para preservar a integridade das pessoas que por ali transitam.
                                      Antes que condenem a população - como fez hoje uma conhecida rede de televisão – aquela do plim,plim -  tratando-os como bandidos, quase que de forma generalizada - quero afirmar que a população do município é constituída de gente ordeira e trabalhadora. Um dos aspectos mais importantes dos saques ali ocorridos é que podemos tirar algumas lições fundamentais para começarmos a entender sua complexidade, quiçá, antecipando-se a outros episódios em gestação. Em termos de arrombamentos e saques, já foi possível observar, por exemplo, uma possível generalização para os municípios vizinhos, e há relatos até mesmo em cidades do interior do Estado.
                                      Mudanças profundas na "agenda pública" já foi reivindicada pela população desde as manifestações de Junho de 2013. O poder público, em todos os níveis, solenemente, ignorou-as. Alguém já teve a curiosidade de checar a quantas andam os indicadores sociais de educação, saúde, habitação, emprego, renda, de nossa antiga Maricota? Os governantes estão brincando com fogo. Há, na cidade, alguns indicadores que podem contribuir para essas situações de convulsão social. Há um número expressivo de pessoas morando em condições sub-humanas; é grande o comércio de entorpecentes na cidade; Assim como Goiana, ali também é registrada uma presença grande da exploração de sexual de crianças e adolescentes; apesar do forte comércio varejista e da presença de empresas de porte, ainda é alto o índice de desempregados na cidade, portanto, sem acesso até mesmo aos bens de consumo essenciais. O município comporta duas unidades prisionais, onde ocorrem rebeliões com alguma frequência.
                                      Em 2011 ocorreram saques e depredações em Londres. Tivemos a curiosidade de reler um texto do festejado sociólogo polonês, Zygmunt Bauman, sobre o assunto. Lembramos também das aulas da professora Danielle Perin Rocha Pitta, antropóloga, quando ela falava sobre a questão da  felicidade em nossa sociedade ocidental. Numa sociedade centrada na supervalorização do "ter", possivelmente, as pessoas mais felizes, em tese, são aquelas que têm acesso aos bens materiais, o que motiva uma busca incessante pelo consumismo, estimulado pelos meios de comunicação através da propaganda. Na outra vertente do problema, uma grande frustração e rancor entre aqueles (cidadãos?) excluídos dos bens de consumo modernos, cuja tecnologia muda significativamente a cada seis meses. Muitos aparelhos de televisão de tela plana, LCD, dessas fininhas, foram saqueados. Quem suportaria assistir aos jogos da Copa numa velha televisão de tubo de imagem depois do bombardeio publicitário em torno desses novos aparelhos de TV?
                                      Bauman classificou o movimento de Londres, na Inglaterra, como um "motim dos consumidores excluídos". Se acompanharmos sua linha de raciocínio, suas observações estabelecem um vínculo quase orgânico entre Londres e Abreu e Lima, nossa querida Maricota. Se não, vejamos. Impõe-se como necessário uma mudança cultural, acompanhada de reformas sociais. Ao estabelecermos o vínculo entre riqueza e felicidade, esgarça-se o espírito comunitário, sobressaindo-se a inveja, o rancor, a arrogância e outros adjetivos do gênero. Faz muito tempo que se deixou de comprar carro apenas para se locomover. Na realidade, trata-se de um símbolo de status e, portanto, de diferenciação e ostentação. As inovações tecnológicas nos modelos são simples, mas a posição do farol – indicando, por vezes, o ano do carro – faz uma diferença descomunal entre os cidadãos-consumidores. Já conheci consumidores de classe média entrarem em depressão por não reunirem condições de trocar de carro.
                                      Em Abreu e Lima existe uma abismo de desigualdades  sociais. O que ocorreu na cidade - mesmo considerando-se a participação de gente de bem e de crianças - foi uma explosão de frustrações acumuladas. Uma distopia proporcionada pela sociedade de consumo, aliada à ausência do poder público em mudar a agenda de suas prioridades - corrompidas e mal conduzidas - para atender às demandas legítimas da população. Não duvido nada que a população da cidade, refeita daquele impulso de ação coletiva, vá atender aos apelos de Dona Irene e se dirigir às Lojas da Eletro-Shopping para apanharem os seus carnês e efetuarem os pagamentos das prestações.
                                      Assim que se elegeu governador do Estado de Pernambuco, o hoje candidato à Presidência da República, Eduardo Campos, buscou apoio na academia. O Pacto pela Vida, apresentado como uma das principais vitrines do seu Governo, é um exemplo disso. Aos poucos, por diversas razões, essa lua-de-mel foi se exaurindo, até a consolidação de um hiato profundo. Hoje, encontra-se na UFPE um dos principais focos de oposição ao ex-governador, inclusive no centro onde ele estudou quando mais jovem. Não raro, a arrogância cega os governantes. A soberba se encarrega de completar o serviço. Um pouco de humildade faria muito bem aos nossos gestores. Os problemas do Pacto pela Vida, por exemplo, quase todos os dias, estão sendo postos pelos acadêmicos.
                                      Agora ficamos sabendo que o Governo do Estado estaria contratando uma empresa para realizar um amplo levantamento sobre as causas dos saques e vandalismos que ocorreram na cidade de Abreu e Lima, há duas semanas atrás. O objetivo seria o de evitar ou prevenir possíveis ocorrências similares. Ficamos bastante preocupados com os vieses dessas intervenções. Outro dia, o Estado fez questão de alardear que iria "punir com rigor" os envolvidos naqueles episódios. É impressionante como tudo se encaixa naquela diretriz de proteção do capital, ou seja, em nenhum momento observa-se uma preocupação do Estado em atender às legitimas demandas daquela população no que concerne às políticas públicas de saúde, educação, mobilidade, habitação, trabalho, renda etc. Convém informar que as UPPs instaladas no Rio de Janeiro pecaram exatamente nesse aspecto. Cercaram, ocuparam o território, impuseram a presença militar do Estado, mas esqueceram das questões sociais essenciais.
                                      Desde junho de 2013 que a população pede mudanças nessa agenda pública, conforme afirmamos. Os governantes continuam fazendo ouvidos de moucos. Qualquer dia desses a porca torce o rabo novamente. É essa "seletividade" de ações de programas como o Pacto pela Vida - orientado para a defesa dos cidadãos-consumidores e incluídos socialmente, além do comércio - que estão levando à ruína esse Governo. O conceito de segurança pública deve contemplar as questões postas acima e não se limitar, unicamente, "punir" os transgressores, por vezes, com a morte. Há quem não curta muito a idéia de levar o sociólogo polonês Zygmunt Bauman para visitar Abreu e Lima, mas ele tem razão ao observar que esse apelo demasiado ao consumismo esgarça os laços comunitários, além de proporcionar enormes frustrações entre aqueles cidadãos induzidos/privados desse consumo.
                                      Posso assegurar que ele ficaria muito bem por aqui, saboreando as mangas Maranhão, comendo as castanhas de caju torradas com palhas de bananeiras do nosso sítio. Se chegar na invernada, ainda poderá experimentar as deliciosas bundas de tanajuras, fritas na manteiga de garrafa, com farinha. Numa sociedade onde o que vale como critério de cidadania é o "ter" acesso ao consumo, aquelas hordas que não conseguem atingir esse objetivo - que também é um direito deles - certamente, terão que ser "contida" através de um Estado policialesco e repressor. Como essas contradições estão no DNA do capitalismo, faz sentido a observação do filósofo Slavoj Zizek, quando ele se refere à tendência de fortalecimento autoritário do exercício do poder político. Ações repressoras, voltadas para conter a fúria dos não-consumidores. Um Estado de Exceção Episódico, como afirma Liana Cirne, professora da Universidade Federal de Pernambuco.
                                      Tanto aqui em Pernambuco como em outros Estados da Federação, as políticas de segurança pública estão sendo orientadas por alguns vieses profundamente equivocados, quase sempre pautadas pelo "endurecimento" das ações contras os mais vulneráveis, notadamente os contingentes populacionais mais empobrecidos, moradores das periferias, de cor negra, “futuros” traficantes, bandidos e marginais. O que está em jogo é o novo conceito de  "cidadão", ou seja, o cara que tem acesso aos bens de consumo capitalista, que desfila com seus carrões, moram em bairros nobres, almoçam em restaurantes chiques e compram suas guloseimas nas delicatessen  nos finais de tarde, numa ótica mercadológica, esse merece o tal status. 
                                      Quem não cumpre esses requisitos não merece o status de "cidadão". É more or less isso o que vem ocorrendo. Talvez seja o momento de rediscutir "valores" e "agenda pública". Os maiores "saqueadores" estão inseridos no aparelho de Estado, alguns sob o manto da impunidade, com uma ampla rede de proteção. Basta observar os dados mais recentes, informados pelo TCE, envolvendo prefeitos e servidores públicos "pegos" em maracutaias com o dinheiro de nossos impostos. Os rebelados - ou excluídos do consumo - acabaram devolvendo, em sua maioria, as mercadorias saqueadas nas lojas durante a greve da Polícia Militar. Qual o montante que esses políticos devolverão ao erário? Não vale o argumento de que uma situação poderia justificar a outra. Em certos aspectos, ambas estão equivocadas.
                                      Mas, o exemplo dos que nos governam, possivelmente, surtiria um efeito pedagógico enorme. Exemplo e sensibilidade para entender a origem do ovo da serpente, senhor governador. Vamos deixar de maquiagens. Política de segurança pública orientada quase que exclusivamente para defender o patrimônio e os cidadãos-consumidores? Isso não pode dar certo. Vejamos o que diz sobre isso a socióloga Maria Helena Moreira Alves, professora aposentada da Universidade Federal do Rio de Janeiro:
“A população que está sofrendo esse processo é aquela que não é útil para o sistema econômico. Então, se eliminá­-la, não faz falta. O que eles estão eli­minando são os jovens pobres, negros, analfabetos que não servem para a mão de obra, aquela mão de obra fácil, que já tem muito. Em termos de direitos hu­manos, o Brasil é um dos piores países. É sempre importante lembrar que esta­mos em um país que não está em guerra declarada, embora o ex-governador do Rio de Janeiro tenha declarado guer­ra, mas isso foi da cabeça dele. O Bra­sil está em situação de rebelião popular, mas não é uma guerra civil, ainda. Es­pero que não venha a ser. Se continu­ar essa pressão, até pode vir a ser, co­mo é o caso da Colômbia. Muitos ca­sos, como o da Nicarágua, com o levan­te de Manágua, que eu vivi quando mo­rei lá, foram causados também pelo ter­ror, que controla até certo ponto. De­pois, quando você não tem mais espe­rança, acaba o medo. O levante de Ma­nágua foi quando aconteceu a operação Herodes, no final do governo contra os sandinistas, na qual eles mandaram ro­dear certas áreas mais combativas de Manágua, retiraram à noite das casas os maiores de dez anos e metralharam na rua, com argumento de que eles já estavam entrando na Frente Sandinista de Libertação Nacional. É muito pareci­do com a forma como a polícia brasilei­ra fala que o jovem vai virar traficante: “Nasceu, vira criminoso”. E eles mata­ram tantas crianças, que houve uma re­belião total, as pessoas se juntaram aos sandinistas e fortaleceram o movimen­to, que ganhou a revolução. E as pesso­as falaram que acabou o medo quando não tinham mais nada a perder. Hoje, o que temos? O Bope entra nas casas, arromba as portas, bate nas pessoas... Ouvi relatos de mulheres que falavam “Graças a Deus meu marido não esta­va em casa, porque quando tem homem eles matam”.

Bob Fernandes / Ronaldo e Joana Havelange entregam o ouro

Michel Zaidan Filho: A metamorfose


 

É natural que os políticos, em plena campanha eleitoral, mudem e produzam atos retóricos destinados a classes de eleitores especiais (os empresários, os militares, os religiosos etc.). Mas, a operação eleitoreira tem limites quando ofende à consciência democrática e aos direitos de centenas de famílias que tiveram seus parentes chacinados pela ditatura militar, e ainda hoje aguardam uma resposta oficial sobre  o paradeiro deles. O que estamos assistindo nesses dias é um verdadeiro festival de oportunismo político por parte de certo candidato, com o fim de agradar aos militares e os empresários do agro-negócio.
                         É inconcebível (e uma falsificação da história) dizer que a anistia permitida pela ditadura militar no Brasil foi ampla e irrestrita. É tão falsa e mentirosa a declaração que se choca com o fato de que o último preso político (o filho de Nelson Rodrigues) ter sido solto, bem depois da lei da anistia, e pelo fato de o pai está agonizando. Ele que tanto pediu aos militares pela soltura do filho, Nelsinho. Pior é a ofensa à memória dos bravos militantes que lutaram pela caráter amplo e irrestrito da anistia e foram derrotados. Admitir, por puro oportunismo, que a anistia foi ampla e irrestrita e ser contra a reabertura dos processos contra os agentes do Estado que cometeram crimes contra a humanidade e os direitos humanos, é uma flagrante contradição com a medida que criou as Comissões pela Verdade e a Justiça, mesmo que tenha sido feita para agradar aliados e ex-inimigos, como aconteceu em Pernambuco.
                          Das duas, uma: ou o candidato se coloca ao lado dos militares e daqueles que acham que houve uma guerra no Brasil e a violência exercida pelos agentes do Estado foi justa e não há o que apurar ou informar; ou ele se coloca ao lado da sociedade civil brasileira que quer, exige, clama  por justiça e verdade sobre o que aconteceu durante os anos de chumbo. Não dá é para ficar no meio-termo, agradar aos militares e aos familiares das vítimas da ditadura militar.
                           Se o atual candidato e ex-governador tivesse algum familiar seu ou amigo chacinado  pelo regime de exceção, ele não agiria desta forma. Pelo contrário, a sua família e seus amigos hoje desfrutam de todo prestígio e regalias  próprias das famílias reais. Mas a maioria das famílias plebéias que não contam com as benesses do poder e dos aduladores de sempre, esperam - na chuva e no sol - pela plena reparação dos crimes cometidos em nome das famigeradas "razões de estado", contra seus parentes e amigos.
                          Talvez esteja na hora de se iniciar no Brasil e em Pernambuco um novo movimento pela  reparação desses crimes. E os democratas de ocasião terão que retirar suas máscaras e assumir suas verdadeiras identidades.
Michel Zaidan é filósofo, historiador e professor da Universidade Federal de Pernambuco. 

quarta-feira, 28 de maio de 2014

O pragmatismo de Campos e a velha política

Texto publicado ontem no Estadão Noite 
O pré-candidato à Presidência pelo PSB, Eduardo Campos, esteve na segunda-feira em São Paulo em um evento para 200 empresários, organizado pelo Estado e pela Agência Corpora Reputação Corporativa. Lá, disse que pretende acabar com a troca de favores e cargos que se estabeleceu no presidencialismo de coalizão brasileiro e que vai romper com as “velhas raposas” da política. Esse tem sido o mantra de Campos, entoado, horas depois, em entrevista ao Roda Viva, da TV Cultura. Disse que a “sétima economia do mundo” não pode fazer “política velha”, ou seja, distribuir ministérios para manter a base política.
O pré-candidato é experiente, sabe como funciona a política brasileira e a diferença entre discurso e prática. Quando foi eleito governador de Pernambuco, em 2006, tinha o apoio de 17 partidos. Campos teve de abrigar a turma na sua gestão. Logo de saída, criou oito novas secretarias, entre as quais Recursos Hídricos, Mulher e Articulação Social e Regional. Elevou de 18 para 26 o número de pastas. Em 2011, logo depois da sua reeleição, criou outras duas: Meio Ambiente e Secopa. “Vamos reduzir pela metade os ministérios”, disse ao criticar os 39 da pré-candidata petista Dilma Rousseff.
Mas por que Campos não reduziu o número de secretarias quando ele era governador de Pernambuco? Sim, ele reduziu. De 28 secretarias para 23. Mas só no apagar das luzes do seu governo, no começo deste ano, quando ele já sabia que três meses depois sairia do governo do Estado para ser candidato à Presidência. Governou, portanto, durante mais de sete anos com uma estrutura administrativa de secretarias maior do que a que recebeu ao assumir em 2007.
Em outro momento da entrevista, Campos disse ser necessário ter “coragem de colocar na oposição” as velhas raposas. Tampouco foi isso que ele fez em Pernambuco. Inclusive, deu sobrevida política a muitas delas. Nos quase oito anos de governo, nomeou parentes de políticos, que podem ser considerados “velhas raposas”. A filha de Severino Cavalcanti (PP), Ana Cavalcanti, foi indicada para a Secretaria dos Esportes. Sebastião Oliveira, primo de Inocêncio Oliveira (PR), ocupou a Secretaria dos Transportes – ele emplacou ainda o titular da Secretaria de Turismo.
Campos deu espaço em seu governo para o PT (Cultura), PC do B (Ciência e Tecnologia), PV (Meio Ambiente), PSD (Instituto de Recursos Humanos) e por aí vai. Os partidos que lhe deram apoio na Assembleia participaram da sua administração, como acontece na velha política. Até partidos que eram da oposição ganharam espaço no governo e passaram a apoiá-lo. O PSDB, por exemplo, ganhou a Secretaria de Trabalho e a presidência do Detran – que antes estavam com o PTB. O PMDB, de Jarbas Vasconcelos, também oposição até outro dia, indicará o vice-candidato na chapa do PSB ao governo do Estado neste ano.
Como resultado dessa distribuição de cargos, a oposição ao ex-governador na Assembleia foi raquítica. Das 49 cadeiras de deputados estaduais, nem dez se dispuseram a estar na contramão do Executivo. No final do ano passado, PT e PTB decidiram passar para a oposição. Mas só porque terão candidato próprio na eleição ao governo de Pernambuco. Abandonaram os cargos, num movimento parecido com o do PSB, de Campos, que em 2013 desembarcou do governo Dilma após a decisão de que o ex-governador seria candidato à Presidência.
Campos não é “sonhático”. Sabe como funciona a política brasileira e como, infelizmente, as maiorias no Congresso e nas Assembleias são formadas. Mas disse, no Roda Viva, que no seu caso agregará as legendas em torno de um “programa de governo”. Nada de troca-troca. Retórica parecida surge no PT, da presidente Dilma, e no PSDB, do ex-governador Aécio Neves, quando instados a falar sobre as indicações políticas em seus respectivos governos.
Por fim, o pré-candidato do PSB enalteceu o apoio suprapartidário que sua pré-candidatura recebe em Pernambuco. “O Estado marcha em grande unidade para votar num filho da terra, que governou com largueza, que não perseguiu, que o fez o bem para muita gente e que agora pode ser presidente da República. Então, eu acho bom que o meu Estado esteja se unindo de norte a sul, de leste a oeste, todos os lados políticos para poder ajudar a gente a chegar à presidência da República.”
Sem dúvida, essa unidade é boa para ele. Mas que fique claro que não é pelos olhos azuis de Campos.

Júlia Duailibi, Radar do Estadão, 28/05/2014

#OcupeEstelita e o ataque dos barões da destruição imobiliária em Recife

publicado em 28 de maio de 2014 às 12:43

por Beatriz Brusantin, via Facebook*
Você já ouviu falar do movimento #OcupeEstelita?
Pois está ocorrendo em Recife e é contra um Consórcio chamado Novo Recife da construtora Moura Dubeux e com grande apoio do prefeito Geraldo Julio (indicado de Eduardo Campos).
Trata-se de um projeto repleto de ilegalidades e em cima de um leilão fraudulento. A ocupação está ocorrendo desde a madrugada do dia 22, quando na calada da noite, a Moura Dubeux, sem alvará começou a demolir históricos Armazéns de Açúcar.
Até hoje cerca de 50 pessoas estão ocupando o lugar com diversas atividades culturais, educativas e de conscientização cidadã, que estão atraindo muitos.
A imprensa pernambucana, contudo, silencia sobre o tema.
Obviamente, porque faz parte da “máfia”, a qual tem apoio do Eduardo Campos uma vez que seu partido recebeu uma doação de milhões por parte da Moura Dubeux. Veja as páginas do Direitos Urbanos e observe a movimentação. A veiculação deste movimento seria uma imensa contribuição.
*Beatriz Brusantin (Dra em História Social, prof. universitária)
por Luciana Santos, via Facebook
Sou de Recife e neste momento há um movimento, o #OcupeEstelita, em que a população reivindica o Cais José Estelita, um conjunto histórico de galpões e área ferroviária para ser transformada em um projeto para a cidade. No entanto, a prefeitura tem agido a favor da construtora Moura Dubeux, responsável pelo Projeto Novo Recife, que planeja construir 13 edifícios de até 40 andares, transformando a área em propriedade privada, demolindo os galpões e descaracterizando a paisagem urbana.
Esta mensagem é para que espalhem o movimento nesta página para que mais pessoas no Brasil saibam da situação, que diz respeito também ao candidato à presidência, Eduardo Campos, e está sendo ignorado ou desvirtuado pela imprensa, que não ouve as alternativas que a opinião popular quer mostrar para o projeto.
É muito importante que isto seja compartilhado para ganhar uma boa dimensão nacional.
Por Felipe Melo, professor de biologia da UFPE
Há muitos paralelos entre as teorias ecológicas e a nossa vida como sociedade humana. Apesar de Darwin ter dado o golpe final na ideia de que somos especiais na natureza, o ‪#‎OcupeEstelita‬ vem, 150 anos depois da Origem da Espécies, dar uma evidência inequívoca de que nesse habitat que é a cidade, a ecologia humana faz cada vez mais sentido, somos bichos. E como bichos humanos, quando não estamos satisfeitos com o nosso hábitat, nós o transformamos.
As cidades são o resultado final de um processo de domesticação da natureza que começou desde que aparecemos na terra.
Construir um parque com grama e árvores plantadas ou arranha-céus de vidro são faces da mesma perseguição pela domesticação da natureza. Somos todos na atualidade a resultante desse processo histórico-biológico, talvez encravado na memória de nossos genes que é o de construir nosso próprio hábitat. A diferença está na extensão dos benefícios da domesticação do hábitat urbano. Está no entendimento de qual tipo de domesticação da paisagem e da natureza são desejáveis e quais deles definitivamente funcionais para o hábitat como um todo.
Portanto é de uma tolice imensa achar que as pessoas que ocupam o cais José Estelita nesse momento são neo-hippies saudosistas pregadores da volta à natureza intocada, da não-intervenção nos espaços. Ora, é justamente o contrário que nos move nesse momento, é o desejo de intervenção na cidade. É o desejo de que aquele espaço seja parte de um hábitat, que ele se integre a uma funcionalidade tão necessária para nossa casa. Neste sentido o grupo Direitos Urbanos é didático ao convidar toda a sociedade a discutir democraticamente um modelo de hábitat urbano que seja de fato representativo e funcional.
A palavra ecologia vem do grego, “oikos” que significa casa ou hábitat num sentido mais amplo e ganha força na ciência uma nova concepção de ecossistemas, a ideia de “antroma” e não mais de “bioma”. É a constatação/concepção de que já domesticamos boa parte da natureza e que não é possível pensar ecologicamente os espaços da terra sem a presença humana.
Tal concepção tem aproximado a ecologia dos hábitats urbanos e emprestados conceitos e ferramentas interessantes para o entendimento e planejamento das cidades. Eis então que sob a ótica ecológica moderna (falo da ciência ecológica dura e rigorosa) o “Projeto Novo Recife” termina sendo, paradoxalmente, justamente o contrário da domesticação da natureza. É o apogeu de um modelo concentrador de recursos naturais, desperdiçador de energia, promotor da entropia (caos) e emissões de gases responsáveis pelo aquecimento global e, sobretudo dilapidador de uma das mais importantes propriedades dos sistemas biofísicos, a resiliência. Esta é a capacidade de recuperação dos sistemas frente às perturbações.
Ao permitir que a cidade abrigue em uma das suas porções mais importantes um empreendimento dessa natureza, estaríamos reduzindo mais um pouco a resiliência do Recife, condenando esse ecossistema urbano que é a cidade à instabilidade aguda da qual já padece cronicamente. É deixar escapar justamente a possibilidade de adaptar nosso hábitat às nossas necessidades, que seguramente não são mais uma dezena de torres gigantes de apartamentos e algumas dezenas de milhares de carros.
Por isso, #OcupeEstelita!

(Publicado Originalmente no site Viomundo)

O caráter higienista do Projeto Novo Recife.



José Luiz Gomes da Silva


Continua pelas redes sociais as polêmicas sobre o projeto Novo Recife. As opiniões se radicalizam, entre argumentos a favor e contra o projeto. No dia de ontem, mais um componente, digamos assim, entrou no debate. Em meio às discussões políticas, jurídicas, o caráter das intervenções urbanas, eis que surgiu na rede uma entrevista com o economista ecológico, Clóvis Cavalcanti, da Fundação Joaquim Nabuco. Não que essa temática, mesmo que anpassant, já não esteja inserida nos debates, mas, invocá-la, neste momento, é interessante porque remete, na sua essência, à degradação do conceito de cidadania engendrado por esse processo. Apenas para quem não tomou conhecimento dos fatos, o economista teria sido processado por uma dessas construtoras integrantes do consórcio Novo Recife, ao postar um artigo no Diário de Pernambuco argumentando sobre um possível "roubo de paisagem" ao serem erguidas aquelas duas famosas torres da Moura Dubeux. A paisagem é um direito coletivo e eles, ao erguerem aquelas torres estavam impedindo que esse direito fosse exercido por toda a população. Lembro agora que o IPHAN embargou a construção de um viaduto aqui em Olinda, tempo atrás, acredito, sob o mesmo argumento. Se fosse mantida a altura original, comprometeria a visão do patrimônio histórico da cidade. A construtora que o processou perdeu em todas as instâncias. Essa questão está na raiz das intervenções urbanas do Recife, ou seja, a profunda "seletividade" de sua matriz.. Se, como dizem, há benefícios dessas intervenções, quem vai poder beneficiar-se deles? Até mesmo um logradouro público - uma praça - que ficava nas proximidades das duas torres, quase foi privativada pela população residente nos apartamentos. Não somos necessariamente contra que haja intervenções naquela área do Cais José Estelita. O conceito de patrimônio histórico/artístico, de fato, em situações específicas, talvez não se aplica à situação. Por outro lado, o caráter e a finalidade dessas intervenções precisam, urgentemente, ser revistos. Se não, vejamos. a) Há uma ingerência demasiada dos interesses do capital na tomada de decisões do poder público sobre o assunto. Um lobby pesado, tráfiico de influência, denúncias de pagamento de propinas, financiamentos de campanhas, aparelhamento dos departamentos jurídicos das prefeituras. Num contexto como esse, as decisões não poderiam deixar de ser enviesadas. Torna-se necessário criar mecanimos de envolvimento mais efetivo do cidadão comum nessas decisões. A Prefeitura do Recife, por acaso, ouviu a população do Recife sobre o que fazer com o Cais José Estelita? b) Se considerarmos as últimas intervenções, talvez se aplique aqui uma tendência higienista, como sugere alguns críticos, reservando alguns espaços públicos apenas para os ditos cidadãos-consumidores, aqueles que podem pagar para adquirir uma apartamento residencial ou um sala comercial naquele trecho, que deve custar os olhos da cara. Fala-se em píer, em parques, em espaços culturais, mas, a rigor, certamente pensados para atender às necessidades desses cidadãos. Em última análise, o que está em curso é um banimento da população de baixa renda desses entornos. Coque, Pina, Ilha de Joaneiro estão sendo, gradativamente, descaracterizadas pelo especulação imobiliária imposta pelo capital. Na década de 40 existia uma grande polêmica sobre o que fazer com as palafitas dos bairros 'afogados" do Recife, um verdadeiro laboratório para os trabalhos de sociólogo Josué de Castro. Enquanto o interventor Agamenon Magalhães defendia que eles precisavam ser removidos, de preferência para lá dos Macacos - uma localidade, salvo engano, nas proximidades da cidade de Camaragibe - , Gilberto Freyre considerava os mocambos uma solução de arquitetura engenhosa e, que, portanto, precisavam ser preservadas. Assim como na década de 40, recrudesce no Recife uma solução de força, da imposição de uma lógica orientada pela seletividade "higienista". A cidade, pensa os gestores atuais, deve ficar mesmo para os cidadãos-consumidores. Isso nos faz lembrar de uma crônica que escrevemos sobre a presença de Orson Welles no Brasil. De passagem por essas terras tropicais, ele conheceu três cidades: Recife, Fortaleza e Rio de Janeiro. Aqui no Recife, depois de tomar um porre daqueles, caiu no Rio Capibaribe e quase se afogava. No Rio, fazia suas tomadas para o filme inacabado Its All True - sobre a saga dos jangadeiros cearenses. Eis que o ditador Getúlio Vargas escreveu para o Departamento de Estado Norte-Americano para queixar-se de Orson Welles. Estava bastante preocupado com a presença de favelas, pobres e negros nas tomadas do cineasta. Deixaram Orson à mingua. Nossos governantes estão deixando a população mais empobrecida do Recife à mingua, sem direito de usufruir de sua cidade. Só falta mesmo os cinturões de contenção nos seus entorno. Logo, logo eles estarão sendo erquidos.

Por que tanta greve? Eles querem 1964!


“Não se elegerá. Se for eleita, não governará”, decreta o Freire com “i” !
O PiG (*) convoca greve.

Especialmente na área de transportes, onde a criminalidade se lambuza com o sindicalismo e as polícias estaduais sentam em cima das mãos.

Onde os “líderes” sindicais mais parecem Francisco Julião do que Jimmy Hoffa.

O PiG transforma em conflito “instalação” de índio.

O PiG leva à Granja Comary mais repórter para cobrir a crise do que para conhecer a última tatuagem do Neymar, o Narciso.

O que eles querem ?

Querem o caos que precedeu a queda de Jango.

Querem anabolizar os protestos até de categorias profissionais que, em teoria, não tem nada a ganhar com a difusão do caos que precede o Golpe.

Por que a Big House – o PiG e o PSDB são seus instrumentos – confia tanto nisso, na véspera da Copa ?

(Como o alemão, o americano, o argentino e o espanhol não leem o PiG, virão para a Copa curtir o Brasil !)

A Big House se beneficia de três fatores.

Primeiro, que o Governo federal é trabalhista e fica inibido de conter a baderna, com medo de que possa parecer cerceamento da vontade popular.

(Clique aqui para ler “Não vai ter Copa” fala inglês”.)

(E isso se agrava na cidade de São Paulo, onde o prefeito – excelente !  – é do PT e o do Estado é tucano, cuja Polícia assiste a tudo com atitude tão cúmplice quanto inepta.)

Segundo, porque a Presidenta é mulher.

E nessa terra machista, os marmanjões acham que podem mais.

Que mulher acaba cedendo.

E, por fim, porque a Dilma não tem xerife.

Não tem um Ministro da Justiça que imponha respeito – temor !

Esse é o campo fértil para a tentativa de dar o Golpe nas ruas.

Com o apoio da Globo Overseas, cuja batata assa na Dilma-2015.

O Gilberto Freire com “i” (**) faz com a Dilma o que o Lacerda fez com JK: Dilma não será candidata.

Se for, não será eleita.

Se for eleita, não governará.


Paulo Henrique Amorim


(*) Em nenhuma democracia séria do mundo, jornais conservadores, de baixa qualidade técnica e até sensacionalistas, e uma única rede de televisão têm a importância que têm no Brasil. Eles se transformaram num partido político – o PiG, Partido da Imprensa Golpista.

(**) Ali Kamel, o mais poderoso diretor de jornalismo da história da Globo (o ansioso blogueiro trabalhou com os outros três), deu-se de antropólogo e sociólogo com o livro “Não somos racistas”, onde propõe que o Brasil não tem maioria negra. Por isso, aqui, é conhecido como o Gilberto Freire com “ï”. Conta-se que, um dia, D. Madalena, em Apipucos, admoestou o Mestre: Gilberto, essa carta está há muito tempo em cima da tua mesa e você não abre. Não é para mim, Madalena, respondeu o Mestre, carinhosamente. É para um Gilberto Freire com “i”.




(Publicado originalmente no site Conversa Afiada)

terça-feira, 27 de maio de 2014

Ronaldo: o com vergonha e o sem vergonha

Há quem diga que o sincericídio de Ronaldo tem a ver com o fato de que, no mesmo dia, declarou apoio à candidatura de Aécio Neves.



Antonio Lassance (*)
Arquivo

Ronaldo foi um fenômeno do futebol e é, até hoje, um fenômeno na arte de ganhar dinheiro. É difícil atravessar um intervalo comercial sem ver sua cara e ouvir sua voz vendendo alguma coisa.


Desde que se aposentou dos gramados, sua fortuna cresce alimentada por sua boca. Cada frase de Ronaldo vale ouro e é ensaiada para render dividendos para algum patrocinador.


Por isso, não custa nada perguntar o que Ronaldo ganha com sua declaração de que está envergonhado com os preparativos da Copa.


A pergunta precisa ser feita, pois a declaração acabrunhada é estranha. Vem não só de alguém que, até então, era só elogios e otimismo. Vem de quem é do Conselho de Administração do Comitê Organizador Local da Copa.


Faltando poucos dias para o início da competição, o que devemos achar de quem resolve, simplesmente, lavar as mãos e fingir que não tem nada a ver com a coisa?


A vergonha de Ronaldo tem o efeito bumerangue sobre sua própria imagem, pois mostra alguém que, como se diz no jargão do futebol, "pipocou", fugiu da bola dividida. Alguém que deveria ter usado seu prestígio, desde o início, para ser parte da solução, preferiu tirar o corpo fora e ser parte do problema.


Como organizador, Ronaldo poderia ter dedicado seu tempo a ajudar a que algumas coisas ganhassem mais atenção. Preferiu gastá-lo gravando anúncios publicitários.


Enquanto era tempo, poderia ter pedido mais empenho e rapidez nas obras, tanto as dos estádios quanto as de mobilidade - por que não? 


Poderia ter pedido paz às torcidas e aos manifestantes. Preferiu posar com um terno dourado no Carnaval e, depois, envergonhar-se.


Os preparativos para a Copa já estiveram por um triz, em vários momentos e sob vários aspectos. Ronaldo poderia ter dito, com muita antecedência, por exemplo, que se sentia envergonhado com o abandono a que a Arena da Baixada foi submetida pelo governador do Paraná e pelo prefeito de Curitiba.


De todas, foi a situação mais absurda e que quase comprometeu uma cidade como sede. Ronaldo nunca esteve entre os que correram atrás para cobrar providências, e nem para se mostrar envergonhado. Nenhuma declaraçãozinha.


Também não expressou qualquer sentimento, indignado ou envergonhado, quando da morte do torcedor atingido por uma latrina, no estádio Recife, em uma briga de torcida.


Nada disso. Ronaldo esperou os estádios serem construídos e entregues, os ingressos serem vendidos, as seleções serem convocadas; esperou ter feito todas as propagandas possíveis e imagináveis que poderia para esta Copa. Só então se fez de envergonhado.


Há quem diga que o sincericídio de Ronaldo tem a ver com o fato de que, no mesmo dia, declarou apoio à candidatura de Aécio Neves.


Difícil acreditar que ele, que hoje vive de emprestar sua imagem a vender produtos, esteja entrando nessa, ao lado de Aécio, por pura convicção, e não como garoto propaganda.


Sua vergonha não transpira nada de autêntica. Parece ensaiada e feita sob medida para um comercial, como aqueles com textos decorados e de péssima interpretação, em que o "Fenômeno" vende carros da Fiat, chuteiras da Nike e planos de telefonia da Claro.


Ronaldo, com vergonha ou sem vergonha, é a mesma pessoa. É aquele que vemos todos os dias na tevê e nos outdoors.


Já faz tempo que esse é o mundo do "Fenômeno". Não tem mais nada a ver com  futebol, nem com indignação, nem com um pingo de vergonha.


(*) Antonio Lassance é cientista político.

Documentário: "O complexo de Vira-latas" apresenta visão dos inimigos do Brasil.

Documentário “O Complexo de Vira-latas” apresenta visão dos inimigos do Brasil

publicada terça-feira, 27/05/2014 às 11:54 e atualizada terça-feira, 27/05/2014 às 11:57
Por Eliézer Giazzi, jornalista e um dos criadores do blog Candeia
Com os dias contados para o início da Copa do Mundo no Brasil, a presidente Dilma Rousseff rebateu as críticas do ex-jogador Ronaldo sobre os atrasos na entrega dos estádios prometidos e ao possível vexame em relação aos outros países na organização do evento.
A presidente reafirmou que o país está bem preparado para receber a todos e que os brasileiros não devem ter “complexo de vira-latas”. Mas o que você entende sobre o termo criado por Nelson Rodrigues nos anos 50 e tão repetido nos últimos dias? Seguindo a publicação anterior sobre o assunto, o Candeia apresenta um esclarecedor documentário com a participação de especialistas que fará com que você reflita sobre o tema. Afinal, por que tudo tem que ser feito para mostrar para os outros e não exclusivamente para o prestígio do nosso próprio povo?
O documentário “Complexo de Vira-latas” é uma produção de Cabrueira Filmes e Sem Cortes. Direção de Leandro Caproni; participação de Bruno Aranha, Bruno Silveira, Diego Silva, Nathália Bomfim, Priscila Chibante e Wallace Soares

(Publicado originalmente no site O Escrevinhador)

Perry Anderson: Para quem acha que o Brasil tem o monopólio da corrupção.

publicado em 26 de maio de 2014 às 23:48


Corrupção branca de olhos azuis? Imagina…
Da Redação
O artigo abaixo, que reproduzimos parcialmente graças à tradução de Heloisa Villela, não trata de justificar a corrupção no Brasil. Demonstra, apenas, que a corrupção está intimamente ligada a um modelo de democracia, que cabe reformar com mais democracia, aquela que efetivamente esteja subordinada ao controle popular. O objetivo do artigo foi demonstrar que, contrariamente ao que diz a opinião pública fora da Itália, a corrupção italiana não é excepcional, mas mediana para os padrões europeus. Ou seja, nada de culpar os mediterrâneos, como se fossem corruptos em relação aos nórdicos. No nosso caso, trata-se acima de tudo de um alerta aos simplistas, que acham que a democracia dos outros, “europeia”, está livre dos problemas que enfrentamos aqui simplesmente por ser “europeia”. Viralatas, acordem!
O Desastre Italiano
Perry Anderson, no London Review of Books
A Europa está doente. A gravidade e o motivo da doença são temas nem sempre fáceis de julgar. Mas entre os sintomas, três são conspícuos e se relacionam. O primeiro, e mais conhecido, é a flutuação degenerativa da democracia através do continente, da qual a estrutura da União Europeia (UE) é ao mesmo tempo causa e consequência.
A casta oligarca e seus arranjos constitucionais, concebida inicialmente como andaime provisório para uma soberania popular de escala supranacional que viria depois, se enrijeceu ao longo do tempo.
Os referendos são derrubados regularmente se contrariam a vontade dos governantes.
Eleitores cujas visões são desprezadas pelas elites ignoram as assembleias que em tese os representam; com isso, o comparecimento às urnas diminui sucessivamente a cada eleição.
Burocratas que nunca foram eleitos policiam os orçamentos de parlamentos nacionais desprovidos até mesmo do poder de gastar.
Isso reflete, assim como aprofunda, tendências de longo prazo dentro. A nível nacional, virtualmente em toda parte, executivos domesticam ou manipulam legisladores com muita facilidade; partidos perdem membros; eleitores deixam de acreditar que eles contam, enquanto as opções políticas se estreitam e promessas de mudança nas plataformas políticas desaparecem quando chegam ao poder.
Com essa involução generalizada veio também uma corrupção dominante da classe política, tópico sobre o qual a ciência política, eloquente o suficiente a respeito do que, na linguagem dos contadores, é chamado de déficit democrático da União, tipicamente se cala.
As formas dessa corrupção ainda não encontraram uma taxonomia sistemática.
Existe a corrupção pré-eleitoral: o financiamento de pessoas ou partidos por fontes ilegais – ou algumas legais – mediante promessa, explícita ou tácita, de favores futuros.
Existe a corrupção pós-eleitoral: o uso do cargo para obter dinheiro com a malversação das receitas, ou propinas em contratos.
Existe a compra de vozes ou votos no legislativo.
Existe o roubo direto do bolso público.
Existe a falsificação de credenciais para ganho político.
Existe o enriquecimento através do cargo público depois do evento, como também durante ele.
O panorama desta malavita é comovente. Um afresco dele poderia começar com Helmut Kohl, governante da Alemanha por 16 anos, que amealhou cerca de dois milhões de marcos alemães em fundos lamacentos de doadores ilegais cujos nomes, quando ele foi exposto, se recusou a revelar, com medo de que os favores que eles receberam fossem revelados.
Atravessando o Reno, Jacques Chirac, presidente da República Francesa por 12 anos, foi condenado por desfalcar fundos públicos, abuso do cargo e conflito de interesse, quando sua imunidade terminou.
Nenhum dos dois sofreu qualquer penalidade. Esses eram os políticos mais poderosos de seus tempos na Europa. Uma olhada na cena desde então é suficiente para afastar qualquer ilusão de que eles foram fora do comum.
Na Alemanha, o governo de Gerhard Schröder garantiu um empréstimo de um bilhão de euros à Gazprom para a construção de um oleoduto do Báltico, poucas semanas antes de deixar o cargo de chanceler e entrar na folha de pagamento da Gazprom com um salário mais alto do que o que recebia para governar o país.
Desde que partiu, Angela Merkel viu dois sucessivos presidentes da República serem forçados a renunciar envoltos em controvérsia: Horst Kohler, ex-chefe do FMI, por admitir que o contingente do exército alemão no Afeganistão estava protegendo interesses comerciais da Alemanha; e Christian Wulff, ex-chefe da democracia cristã na Baixa Saxônia, por conta de um empréstimo questionável de um amigo empresário para a casa de Wulff.
Dois ministros de destaque, um da Defesa e o outro da Educação, tiveram que sair quando seus doutorados foram anulados – uma credencial importante para a carreira política na República Federal – por furto intelectual.
Quando essa última, Annette Schavan, íntima de Merkel (que expressou total confiança nela) ainda se agarrava ao cargo, o diário Bild-Zeitung afirmou que ter uma ministra da Educação que falsifica sua pesquisa era como ter um ministro das Finanças que tivesse uma conta secreta na Suíça.
Nem bem se falou, se viu. Na França, o ministro socialista do Orçamento, o cirurgião plástico Jérôme Cahuzac, cuja causa era cobrar probidade fiscal e igualdade, foi flagrado com algo entre 600 mil e 15 milhões de euros escondidos em depósitos na Suíça e em Cingapura.
Nicolas Sarkozy, enquanto isso, é acusado por testemunhas de ter recebido algo em torno de US$ 20 milhões de Kadaffi [o assassinado presidente da Líbia] para a campanha eleitoral que o levou à presidência.
Christine Lagarde, sua ministra das Finanças que agora dirige o FMI, está sendo interrogada por seu papel no pagamento de uma “compensação” de 420 milhões de euros para Bernard Tapie, um conhecido bandido com passagem pela prisão, mais tarde amigo de Sarkozy.
A proximidade tranquila com o crime é bipartidária. François Hollande, atual presidente da República, manteve encontros secretos com sua amante no apartamento da prostituta de um gângster da Córsica morto em uma troca de tiros na ilha, no ano passado.
Na Grã-Bretanha, mais ou menos ao mesmo tempo, o ex-premier Tony Blair estava assessorando Rebekah Brooks, ameaçada de ir para a cadeia por cinco acusações de conspiração criminosa (“Tenha comprimidos para dormir fortes. Isso vai passar. Fique firme”), e recomendou insistentemente que ela “publicasse um relatório estilo Hutton”, como ele havia feito para limpar qualquer participação que seu governo pudesse ter tido na morte de uma pessoa que denunciou sua guerra no Iraque.
Uma invasão com a qual Blair ganhou – claro, para sua Faith Foundation – várias gorjetas e negócios pelo mundo, entre eles, proeminente, o dinheiro de uma empresa de petróleo da Coréia do Sul dirigida por um criminoso condenado que tem interesses no Iraque e na dinastia feudal do Kuwait.
Que recompensa Blair pode ter recebido um pouco mais ao leste, por conselhos profusos dados à ditadura de Nazarbayev ainda não se sabe (“As realizações do Cazaquistão são incríveis. Entretanto, Sr. Presidente, o senhor ressaltou novos desafios em sua mensagem à Nação”. Literalmente).
Em casa, em uma troca de favores sobre a qual ele mentiu ao Parlamento sem o menor escrúpulo, a mão de Blair estava escorregadia, recebendo um milhão de libras para os cofres do partido do magnata das corridas de automóvel, Bernie Ecclestone, atualmente indiciado na Bavária por propinas no valor de 33 milhões de euros.
Na cultura do Novo Trabalhismo, figuras de destaque do círculo de Blair, um dia ministros do governo – Byers, Hoon, Hewitt – poderiam se colocar à venda em seguida. No mesmo período, independentemente de partido, a Câmara dos Comuns foi exposta como uma cloaca de desfalques mesquinhos do dinheiro do contribuinte.
Enquanto isso, na Irlanda, Bertie Ahern, líder do Fianna Fáil [o Partido Republicano], tendo desviado mais de 400 mil euros em pagamentos inexplicáveis, votou para si mesmo o salário mais alto de um primeiro-ministro europeu – 310 mil euros, mais do que o do presidente dos EUA –, um ano antes de pedir demissão em desonra por desonestidade generalizada.
Na Espanha, o atual primeiro ministro, Mariano Rajoy, liderando um governo de direita, foi flagrado com a mão em recibos de propinas de empreiteiras e de outros negócios no valor de um quarto de milhão de euros em uma década, entregues a ele por Luis Bárcenas.
Secretário do Tesouro de Rajoy por dois anos, Bárcenas está preso agora por ter acumulado 48 milhões de euros em contas não declaradas na Suíça. Os registros escritos à mão das transferências de Rajoy para outros notáveis do Partido Popular – incluindo Rodrigo Rato, outro ex-dirigente do FMI – apareceram à vontade em fac-símiles na imprensa espanhola.
Quando o escândalo veio à tona, Rajoy enviou uma mensagem de texto a Bárcenas com palavras virtualmente idênticas às de Blair para Brooks: “Luis, eu entendo. Fique firme. Eu te chamo amanhã. Um abraço”. Enfrentando descaradamente um escândalo no qual 85% do público espanhol acredita que ele está mentindo, Rajoy continua firme no Palácio de La Moncloa.
Já na Grécia, Akis Tsochatzopoulos, sucessivamente ministro do Interior, da Defesa e do Desenvolvimento pelo Pasok, que uma vez chegou muito perto de liderar a democracia social grega, teve menos sorte: foi condenado no outono passado a vinte anos de cadeia por uma formidável carreira de chantagens e lavagem de dinheiro.
Do outro lado da água, Tayip Erdogan, por muito tempo apontado pela mídia europeia e pelo establishment intelectual como o grande estadista da democracia turca, cuja conduta virtualmente deu ao país o direito de membro honorário da UE, mostrou que ele tem valor para ser incluído no ranking de lideranças da União de uma outra forma: em uma conversa gravada, instruindo seu filho sobre onde esconder dez milhões em dinheiro vivo, em outra aumentando o preço da propina em um contrato de construção.
Três ministros do governo caíram depois de revelações semelhantes, antes que Erdogan expurgasse a força policial e o Judiciário para ter certeza de que o assunto não seguiria em frente.
Enquanto ele fazia isso, a Comissão Europeia divulgou seu primeiro relatório sobre a corrupção na União, cujo extensão o comissário autor do trabalho descreveu como “de tirar o fôlego”: uma estimativa, por baixo, de que custa à UE tanto quanto o orçamento total da União, em torno de 120 bilhões de euros por ano – sendo que o montante real “deve ser bem mais alto”. Prudentemente, o relatório cobriu apenas estados-membros. A UE, cuja Comissão inteira, em um passado recente, foi obrigada a entregar o cargo sob uma nuvem negra, foi excluída.
Comum em uma União que se apresenta ao mundo como tutora da moral, a poluição do poder pelo dinheiro e pela fraude se segue à filtragem da substância ou do envolvimento na democracia.
Elites libertas ou da real divisão no topo ou de cobrança significativa de baixo podem se enriquecer sem distração ou castigo.
A exposição deixa de ter tanta relevância, já que a impunidade se torna regra. Assim como os banqueiros, lideranças políticas não vão para a cadeia.
Dessa fauna toda, apenas um grego idoso sofreu essa indignidade.
Mas a corrupção não é apenas uma função do declínio da ordem política.
Ela é também, claro, sintoma do regime econômico que tomou conta da Europa desde os anos 80. No universo neoliberal, no qual os mercados são a medida de valor, o dinheiro se torna, mais diretamente do que nunca, a medida de tudo.
Se hospitais, escolas e presídios podem ser privatizados como empreendimentos com fins lucrativos, por que não também os cargos públicos?

(Publicado originalmente no site Viomundo)

Eduardo Campos no Roda Viva - entrevista completa